No último dia 23/04, o armador Mike James assinou um contrato de dez dias com o Brooklyn Nets (posteriormente renovado por mais dez) e voltou à NBA após três anos desde sua primeira passagem pela liga americana, depois de ter tido três ótimas temporadas no basquete europeu. Ótimas dentro de quadra, sendo destaque e principal jogador das equipes em que atuou, principalmente em Panathinaikos, Olimpia Milão e CSKA Moscou. Aliás, James ainda é jogador do time russo e está na NBA com uma espécie de empréstimo. O caso não é tão simples, mas vamos tentar entender.
Um retorno curioso
Mike James saiu do ensino médio e disputou quatro temporadas (2008 a 2012) no basquete universitário americano, por duas universidades diferentes da primeira divisão da NCAA, organização que promove o esporte universitário nos EUA. Ele se inscreveu no Draft da NBA de 2012, mas não foi selecionado por nenhum time. Naquele mesmo ano, ele foi para a Europa, onde se juntou ao modesto Zagreb, da Croácia, e iniciou sua carreira profissional. Ele passaria, então, por seis clubes diferentes nos cinco anos seguintes, passando por Israel, Itália e Grécia.
Ele chamou a atenção da NBA e em julho de 2017 ele recebeu sua primeira chance na maior liga do planeta. Ele passou sete meses tentando se firmar na liga, passando por Phoenix Suns e New Orleans Pelicans, mas não agradou. Em fevereiro de 2018, ele foi dispensado do Pelicans e acertou sua volta para o Panathinaikos, da Grécia. Ao fim daquela temporada, ele foi para a Olimpia Milão, da Itália, e para a temporada 2019-20 ele fechou um contrato de um ano com o CSKA.
No início da atual temporada, mais especificamente em novembro de 2020, ele deu a contundente declaração de que não tinha mais intenções de tentar uma carreira na NBA, por dizer que não se importava mais com isso. Ele também cita que não teve nenhuma explicação quando o Phoenix Suns o dispensou, em dezembro de 2017, mesmo após o jogador ter tido uma passagem decente pelo time do Arizona: 10,4 pontos, em 20 minutos por jogo, para uma média de 14,2 de PER (Player efficiency rating).
Os problemas de disciplina
James é um armador muito bom, veloz, com bom arremesso e boa visão de quadra. Mesmo assim, com todas essas qualidades o americanos estava afastado do CSKA e não era por conta da COVID-19. Infelizmente, James tem um histórico bem amplo de indisciplina e foi esse o motivo do seu afastamento do time russo e também da Olimpia Milão.
Aliás, foi por essa “personalidade forte” que o armador chegou ao CSKA. Na temporada 2018-19 James era o destaque da equipe da Olimpia na Euroliga, com média de 19,8 pontos e 6,4 assistências por jogo. Porém, o proprietário da equipe, Giorgio Armani, resolveu mudar a comissão técnica, demitindo Simone Pianigiani e repatriando Ettore Messina, que está revolucionando a equipe italiana.
O novo treinador não chegou a treinar James e o colocou no mercado antes mesmo da pré-temporada. No final de abril, a Gazzetta dello Sport, principal jornal esportivo da Itália, divulgou o suposto email enviado por Messina ao jogador em 2019.
“Em sinal de respeito, quero comunicar pessoalmente a minha decisão. Por escolha minha, você não terá espaço na equipe na próxima temporada. Como te disse nas nossas conversas telefônicas, assumi o controle da Olimpia em junho e tenho o maior respeito pelo seu talento, mas estou preocupado com a longa lista de comportamentos e violações às regras da equipe que você teve na última temporada. Perguntei de forma explícita se você estava de acordo em seguir o modelo disciplinar dentro e fora da quadra que iremos adotar daqui em diante. Mas nunca tive uma resposta verbal completa em relação a isso”, escreveu Messina.
Mas os problemas disciplinares vêm de antes. “Depois das nossas conversas, falei com membros do Panathinaikos, Phoenix Suns e até com seus técnicos das categorias de base. Essas conversas reforçaram as minhas convicções. Acredito que apesar do seu talento incrível, em um ambiente controlado existem muitos riscos que você possa quebrar essas regras e virar um problema para a equipe mais do que uma solução”, continuou o treinador.
Com isso, o CSKA aproveitou e topou o risco de trazer James para a equipe. Na Rússia, James estava jogando muito bem. Na temporada de 2019-20, interrompida pela pandemia, ele teve médias de 21,3 pontos e 4,3 assistências por jogo na Euroliga e nesta temporada os números não estavam muito diferentes, com médias por jogo de 19,3 pontos e 5,7 assistências. Ele era o grande favorito para ser o MVP da competição europeia.
Quando tudo começou a dar errado
Porém nem tudo são rosas. As dificuldades no CSKA começaram com um problema familiar de James. Seu avô faleceu na terceira semana de janeiro e ele queria ter voltado aos Estados Unidos para prestar homenagem a um dos maiores incentivadores da sua carreira. Devido à pandemia e dificuldades logísticas de fazer o atleta voltar para a Rússia, o pedido foi negado. Daquele momento em diante, nada mais foi como antes.
Na época dessa perda em sua família, começaram a circular diversos boatos de que James teria ficado bastante irritado com a decisão do CSKA. Na mesma semana, ele foi suspenso pelo “Clube do Exército”, pelo que o clube informou ter havido um incidente dentro dos vestiários envolvendo James. Imediatamente, os jornais noticiaram uma suposta briga entre James e seu colega de equipe, o pivô Tornike Shengelia, boato que foi negado pelos dois.
Para piorar ainda mais as coisas, cerca de duas semanas depois deste episódio, James teve mais uma perda em sua família. O parentesco desse segundo familiar dele que faleceu não foi revelado e, desta vez, o CSKA deu a ele a liberação para voltar aos EUA, para estar com sua família. Após passar cerca de dez dias em seu país natal, o armador se reuniu com a equipe no final de fevereiro, para dar continuidade à temporada. Mas seria por pouco tempo.
No último dia 27/03, durante uma partida da Liga VTB, o campeonato doméstico com clubes de cinco nações da antiga URSS, o jogador teve um atrito com o treinador do CSKA, o grego, Dimitris Itoudis, que fez a relação degringolar. Os dois discutiram durante um pedido de tempo com apenas três minutos de jogo e o jogador acabou sendo tirado do restante do jogo.
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Dois dias depois, Itoudis anunciou uma nova suspensão para James. E naquela mesma semana o treinador grego deixou a entender, em uma entrevista coletiva, que não contaria mais com os serviços de James para o restante da atual temporada. Desde a suspensão definitiva de seu astro, o CSKA disputou dez jogos. Pela VTB, foram quatro, dos quais o CSKA venceu dois e perdeu dois. Mas, nos seis pela Euroliga, o time venceu todos, incluindo uma “varrida” para cima do Fenerbahçe, que classificou a equipe para seu nono Final Four consecutivo.
Em sua primeira entrevista como jogador dos Nets, James explicou a sua saída do time russo. “Aconteceram coisas na minha vida privada e tive a sensação que as coisas não foram como eu imaginei que poderiam ter sido. Nos desentendemos por motivos fora do basquete”, explicou o jogador.
O treinador também falou sobre a situação logo após a classificação do CSKA para a Final Four. “Em um dia como esse não queria falar sobre certas pessoas, mas vou dizer uma coisa. Em todos os empregos, se você sente que não pertence ao ambiente você procura uma forma de sair. Se você acha que pertence, dá o seu melhor para permanecer. Eu como treinador não posso fechar um olho para a ética”, disse Itoudis, sem citar o nome do jogador.
O braço de ferro entre James e Itoudis ainda não acabou. O treinador, que levou o time russo a cinco Final Fours e lhe deu dois títulos da Euroliga, tem contrato até junho de 2021 e James até 2023. A permanência dos dois parece improvável e os dirigentes vão ter que tomar uma decisão, entre o projeto que vem dando certo com Itoudis ou o talentoso e imprevisível James.