Este artigo faz parte da série de textos dedicados a contar a história de grandes jogadores, times e treinadores do basquete europeu. Clique aqui para ler outros textos que fazem parte desta série.

Ficha técnica
Nome:  Oscar Daniel Bezerra Schmidt;
Local de nascimento: Natal, Rio Grande do Norte🇧🇷;
Ano de nascimento: 1958;
Posição: ala;
Carreira: de 1974 a 2003;
Principais Títulos: pelos clubes, Copa Intercontinental da FIBA (1979), Campeonato Sul-Americano de Clubes (1979), 3x campeão brasileiro (1977, 1979, 1996), 2x campeão italiano da segunda divisão (1983 e 1991), campeão da Copa da Itália (1988); pela seleção, bronze na Copa do Mundo (1978), campeão dos Jogos Pan-Americanos (1987), 3x campeão Sul-Americano (1977, 1983 e 1985);
Honras: maior cestinha da história dos Jogos Olímpicos, maior cestinha da história da Copa do Mundo, 7x cestinha do campeonato italiano, 10x selecionado para o Jogo das Estrelas do campeonato italiano, cestinha do campeonato espanhol (1994), 2x selecionado para o Jogo das Estrelas do campeonato espanhol, 8x cestinha do campeonato brasileiro, membro do Hall da Fama do Basquete, membro do Hall da Fama da FIBA, membro do Hall da Fama do basquete italiano, camisa #18 aposentada pela Juvecaserta, camisa #11 aposentada pela Pavia, camisa #14 aposentada pelo Flamengo;

Eu diria que quase todo brasileiro sabe, no mínimo, quem é Oscar. Os que gostam de esportes sabem que ele foi um jogador de basquete muito bom. Quem acompanha basquete, especificamente, sabe que ele é o maior jogador brasileiro que já jogou. Mas alguns talvez não saibam que ele é o jogador que mais pontos marcou na história do basquete, com 49.737 pontos marcados em clubes e seleção (Kareem Abdul-Jabbar, o maior cestinha da história da NBA, marcou pouco mais de 38 mil). Ou que ele seja, até hoje, o maior cestinha da história dos Jogos Olímpicos (1.093 pontos totais em 38 jogos). Ou que ele detenha os recordes de pontos em uma única partida em ambas, Olimpíadas (55 pontos) e Copa do Mundo (52). O que quero dizer é: Oscar tem o respeito que merece, mas talvez uma boa parte dos fãs de basquete brasileiros não tenham uma noção exata do tamanho da lenda que é o potiguar “Mão Santa”.

Recentemente, muitos fãs mais novos puderam conhecer com um pouco mais de detalhe a história de Michael Jordan, através do documentário “The Last Dance”. Com este texto, tentaremos mostrar um pouquinho do que foi a carreira de Oscar, com o foco, obviamente, em sua carreira na Europa, para que aqueles que talvez não saibam muitos detalhes sobre ele. Se pararmos para pensar, como o basquete europeu ainda não é tão popular fora da Europa hoje (se comparado à NBA), imagina como era para um brasileiro que vivia o esporte nos anos 1980, para ter acesso a detalhes dos campeonatos de lá, sem sequer acesso à internet. Esperamos que este texto traga um pouco de luz sobre o tema e que mais pessoas possam saber os detalhes do jogador que Kobe Bryant chamou de seu ídolo da infância, quando seu pai jogava na Itália.

Levado para a Itália por um técnico a quem ele derrotou

Oscar iniciou a carreira nas categorias de base do Palmeiras, em 1974, onde jogou por cinco anos. Ele começou a ganhar projeção internacional relevante quando foi um dos cestinhas da seleção (17,7 pontos por jogo) na Copa do Mundo de 1978, competição na qual o Brasil terminou a fase semifinal em terceiro lugar, derrotando a Itália na disputa do bronze. Em 1979 ele passou para o E.C. Sírio Libanês, também de São Paulo, com o qual conquistou a Copa Intercontinental da FIBA (o “Mundial de Clubes”). Na final contra o então campeão da Euroliga, o Bosna, da Iugoslávia, o ala acabou com a partida, marcando 42 pontos. Mal sabia ele que aquela performance no torneio seria um dos seus principais passaportes para o basquete europeu.

Quem treinava o Bosna naquele mundial de 1979 era Bogdan Tanjević. Em 1982, após ter passado dois anos na comissão técnica da seleção de seu país, a Iugoslávia, ele aceitou o convite para treinar a pequena Juvecaserta Basket (chamada por razões de patrocínio Indesit Caserta, na época), da região da Campânia, na Itália. Até aquele momento, o clube havia passado os primeiros 30 anos de sua existência lutando para subir de divisões, alternando presenças na terceira e na segunda do campeonato italiano, sem nunca ter alcançado a elite. Mas Tanjević mudaria isso e, para tal, uma de suas primeiras atitudes para erguer o clube foi pedir a contratação de seu algoz em anos anteriores: Oscar.

Pelas oito temporadas seguintes, a pequena cidade de Caserta veria seu pequeno clube ser erguido à condição de um dos principais clubes, na liga mais forte da Europa ocidental naquele período. Além de, por duas vezes, ficar a uma vitória de um título europeu. E não há como dizer que Oscar não tenha sido o grande responsável por isso. O primeiro passo foi na temporada 1982-83, quando o clube ainda estava na segunda divisão. Oscar foi o melhor jogador do time no torneio, com médias de 29,9 pontos, 8,7 rebotes e 2,5 roubadas de bola por jogo. A Caserta subiria para a elite no ano seguinte, após ter tido a segunda melhor campanha do campeonato (21-9) e o melhor ataque da competição. Além da promoção, a equipe também pôde, através do “exótico” formato da Serie A, participar dos playoffs da primeira divisão daquele ano: os quatro primeiros colocados da primeira divisão iriam direto para as quartas-de-final, enquanto os times de quinto a oitavo disputavam as oitavas-de-final com os quatro primeiros colocados da primeira divisão. Isso lhe permitiu ser uma das quatro representantes italianas na Copa Korać do ano seguinte, a competição européia de terceiro nível daqueles tempos.

No primeiro ano disputando a Serie A, a Caserta não fez feio. Um oitavo lugar na temporada regular, que lhe levou novamente às oitavas-de-final, onde eliminaram a Reggiana, líder da segunda divisão. Mas o time caiu nas quartas diante da gigante Olimpia Milano. Para Oscar, foi o primeiro de vários anos especiais: ele foi o maior pontuador do campeonato, com uma média de 28,1 pontos e 8,6 rebotes. O grande palco não estava assustando o brasileiro. Pelo contrário: ele dominava os defensores em um dos campeonatos mais difíceis do planeta. Naquele ano, também, a Caserta ainda chegaria à final da Coppa Italia e às quartas da Copa Korać, em sua primeiríssima participação em competição européia.

A primeira temporada de Oscar na primeira divisão não foi um “acidente”. De maneira incrível, ele não seria o cestinha do campeonato italiano somente naquela temporada 1983-84, mas também em todas as cinco temporadas seguintes. Sim. De 1983 a 1989, nenhum jogador marcou mais pontos que Oscar no campeonato italiano. E carregada pelo desempenho fantástico do “Mão Santa”, a Caserta começou a alçar vôos mais altos coletivamente. Foi naquele verão, também, que o jogador foi selecionado no Draft da NBA pelo New Jersey Nets, na 6ª rodada (131ª escolha), mas optou por não jogar na liga, pois, naqueles tempos, jogadores da NBA não eram permitidos defender suas seleções nacionais. Ele chama a recusa de “a decisão mais fácil” de sua vida. Especula-se, também, que se ele fosse para a NBA naquele período, ele receberia um salário três vezes menor do que o que recebia na Caserta, o que pode tê-lo influenciado também.

Na temporada 1984-85, em que Oscar teve a média de 30,0 pontos por jogo, 7,7 rebotes, 2,1 roubadas de bola e acertou 50% dos arremessos de três, o time ficou em quinto na temporada regular e foi eliminado na semifinal, para a gigante Varese. O banco de dados da liga italiana não tem muitos detalhes anteriores a 1987, mas sabe-se que no ano de 1984 ele marcara 60 pontos em um jogo. Na temporada seguinte, impulsionada pelos 30,7 pontos de média e 8,0 rebotes de média de Oscar, o time chegou ao ponto que talvez nenhum torcedor imaginaria, alcançando a grande final do campeonato italiano, em que caíram diante da Olimpia. Naquela mesma temporada, eles também “bateriam na trave” quando chegaram à final da Copa Korać, sua primeira final européia. Em uma final italiana, nem mesmo os 26 pontos de média (33 no primeiro jogo e 19 no segundo) foram suficientes para superar a Virtus Roma, clube que havia ganhado um scudetto e uma Euroliga nos quatro anos anteriores.

O auge individual de Oscar, em quatro temporadas “absurdas”

Se três anos seguidos como cestinha da Serie A, marcando pelo menos 28 pontos por jogo em cada uma deles, foi impressionante, o que Oscar faria nos quatro anos seguintes seria mais ainda. Já dando um “spoiler”, nas quatro temporadas entre 1986-87 e 1989-90, Oscar nunca teria uma média de pontos menor do que 33,7 por jogo. Mas, mesmo com esse desempenho fantástico, a Juvecaserta não conseguiu montar equipes ao redor dele boas o suficiente para chegar ao tão almejado título italiano.

Após perder a final do scudetto na temporada 1986, eles fizeram outra grande campanha na Serie A de 1986-87. Na temporada regular, a campanha foi mediana (17-3, para um modesto sexto lugar), mas nos playoffs eles simplesmente atropelaram todos os times que viram pela frente, chegando à final novamente, deixando pelo caminho gigantes como a Virtus Bologna e a Cantù, mas foram varridos pela Olimpia na final. Vale lembrar que esse super time da Olimpia, de Mike D’Antoni, Bob McAdoo e Dino Meneghin, estava vencendo seu terceiro scudetto consecutivo e havia acabado de vencer o primeiro título do bicampeonato da Euroliga semanas antes.

Foi na temporada 1987-88 que a Caserta pôde, finalmente, levantar o primeiro troféu de sua história. Com uma campanha invicta, o time consagrou-se campeão da copa da Itália, derrotando a Varese na grande final. Mas o gosto amargo dos fracassos na busca pelo scudetto continuavam, com o time caindo nas quartas-de-final do campeonato. Na Serie A daquele ano, Oscar teria a média inacreditável de 37,2 pontos por jogo, em 32 partidas disputadas. Ele fez pelo menos 40 pontos em 13 deles e pelo menos 50 em quatro deles. E se por um lado o título italiano não veio, o título da Coppa garantiu a primeira participação do time na Copa Saporta, a segunda competição européia de clubes mais importante na época, destinada aos campeões de copas nacionais.

A temporada seguinte não foi de conquistas para a Caserta, novamente. Mesmo com os 35,6 pontos por jogo de Oscar, a equipe não passou das quartas-de-final do campeonato italiano e foi vice da copa da Itália. Mas eles alcançaram também a segunda final européia de sua história, ao chegarem à finalíssima da Copa Saporta, citada anteriormente, na qual encontraram o Real Madrid de Dražen Petrović. Na campanha, eles eliminaram o Zalgiris Kaunas, de Arvydas Sabonis, na semifinal. Neste inacreditável jogo da final contra os espanhóis (assista-o completo aqui), Oscar e Petrović (retratados na foto acima) travaram um duelo histórico, em que o brasileiro fez 44 pontos e o iugoslavo respondeu com 62, seu recorde pessoal. Mas os italianos venderam caro essa partida, com Oscar empatando o jogo com um arremesso fantástico “do meio da rua”, deixando 8 segundos no relógio para o Real tentar evitar a prorrogação, mas sem sucesso. Com o brasileiro cometendo sua quinta falta e deixando o jogo no tempo extra, o Real prevaleceu e venceu por 117 a 113. Confira no vídeo abaixo os melhores lances dos dois jogadores nesse duelo.

Outra vez, na temporada 1989-90, Oscar seria o cestinha máximo da Serie A, anotando uma média de 32,7 pontos por jogo. Porém, terminaria ali a sua passagem pela Caserta. Ao fim daquela temporada, após mais uma queda na semifinal dos playoffs da Serie A e nenhum outro feito, o clube decide começar uma remontagem de seu elenco. Eles não renovaram com Oscar e entregaram o time nas mãos do jovem armador Nando Gentile, além de fazer outras contratações para a temporada seguinte. E a estratégia deu certo, pois, finalmente, o clube se sagraria campeão italiano na temporada 1990-91, cruelmente já sem o maior jogador de sua história.

Os últimos anos na Itália e a mudança para a Espanha

Após não ter seu contrato renovado com a Caserta, Oscar, prestes a completar 32 anos, escolheu permanecer na Itália e assinou com a modesta Pallacanestro Pavia (chamada Fernet Branca Pavia por razões de patrocínio na época), da Lombardia. Naquela temporada 1990-91, o time se encontrava segunda divisão e não jogava a primeira desde 1958. Como vocês podem imaginar, Oscar mudou essa história.

Naquele ano, ele não fez menos do que 27 pontos em nenhuma das 40 partidas. Destas, em somente 13 ele fez menos do que 40 pontos e fez pelo menos 50 onze vezes. Foi durante essa temporada que ele superou o pivô americano Chuck Jura e se tornou o maior cestinha da história do basquete italiano. O pequeno clube conseguiu sua tão sonhada promoção para disputar a Serie A na temporada 1991-92, com Oscar tendo a média histórica de 44,0 pontos por jogo.

Infelizmente, a aventura da Pavia na primeira divisão durou muito pouco, com o time sendo rebaixado após uma única temporada. Naquele 1991-92, Oscar estabeleceria seu recorde pessoal, anotando 66 pontos em um jogo, contribuindo para a média final de 37,7 pontos por jogo. No ano seguinte, seu último na Itália, ele voltou a jogar a segunda divisão com o clube lombardo e foi novamente seu cestinha, marcando 39,6 pontos por jogo.

Em 11 temporadas no basquete italiano, Oscar totalizou 13.957 pontos marcados, batendo por muito o recorde anterior, estabelecido por Jura, mencionado anteriormente, de 9.870 pontos. Essa marca foi alcançada em 403 partidas, dando-lhe uma média de 34,6 por jogo, e só foi superada pelo lendário Antonello Riva no ano de 2000, mas com o mesmo tendo disputado muito mais partidas (785 ao fim da carreira). Até o dia de hoje, Oscar detém o recorde de cestas de três pontos totais marcadas na itália, com 1.558. Ele também ainda é o jogador que mais vezes marcou 50 pontos ou mais, fazendo-o 28 vezes.

No verão europeu de 1993, Oscar partiu para a Espanha, onde defendeu por duas temporadas a camisa do Valladolid. Apesar da fraca campanha do time, que seria rebaixado dentro de quadra naquela temporada 1993-94, Oscar ainda foi o cestinha máximo da ACB naquele ano, anotando uma média de 33,3 pontos por jogo, quase o dobro do melhor jogador e MVP do campeonato, Sabonis, do Real Madrid. O Valladolid pôde permanecer na primeira divisão após o Cajabilbao abrir mão de sua vaga. Em sua última temporada no basquete europeu, Oscar anotou 24,0 pontos por jogo, aos 36 anos, sendo o segundo maior cestinha do campeonato espanhol. Ele retornaria para o Brasil em 1995 e se aposentaria em 2003.

Pela seleção

Oscar Schmidt - RecordesCom a camisa do Brasil, a qual defendia com tanta paixão e a qual o fez ser conhecido até pelos brasileiros que não sabem as regras do esporte, Oscar também foi um dos melhores jogadores do planeta. Todos nós nos lembramos da histórica vitória dos Jogos Pan-Americanos de 1987, em que o Brasil deu à seleção dos EUA sua primeira derrota da história em casa, pois ela se tornou tão midiática. Mas ele também é um dos jogadores mais importantes da história dos Jogos Olímpicos e da Copa do Mundo, ainda que o Brasil não tenha conseguido vencê-las nos tempos de Oscar.

Oscar é o maior pontuador da história das Olímpiadas, tendo marcado 1.093 pontos totais (28,8 por jogo) em cinco edições disputadas entre 1980 e 1996. Ele detém o recorde de pontos em um único jogo masculino (55, contra a Espanha, em 1988). Na edição de Seul, inclusive, ele teve a maior média de pontos de qualquer jogador na história do torneio masculino, com 42,2 por jogo.

Em Copas do Mundo, ele também é o maior cestinha da história, tendo marcado 906 pontos totais (26,7 por jogo), em quatro edições disputadas. Na Copa de 1990, ele foi o cestinha geral, com uma média de 34,6 pontos por jogo. Os 52 pontos que ele marcou contra a Austrália naquela edição são, até hoje, um recorde das Copas do Mundo masculinas.

O discurso de Oscar no Hall da Fama do Basquete (em inglês)

Os 46 pontos contra os EUA no Pan de 1987

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